quarta-feira, 2 de setembro de 2015

LEI ÁUREA



LEI ÁUREA

Por Philippe Lana

Há pouco mais de 127 anos foi celebrado no Brasil aquele que talvez seja considerado o ato mais nobre de todo o século XIX ocorrido no hemisfério sul: a Lei Áurea. Ato tão nobre que resultou na queda e expulsão da Família Real do país, devido à insatisfação dos setores dominantes da política brasileira, a elite econômica ruralista, composta principalmente por escravocratas. Com a lei, muitos ex-donos de escravos tiveram prejuízos e perda significativa da sua mão de obra, em sua maioria escrava, e sem nenhuma indenização da Coroa.

Muitos associam, erroneamente, a figura da Monarquia no Brasil ao regime escravista, como se estivessem ligados, o que não é verdade. Até onde se sabe, quem detinha, de fato, o poder econômico e também político durante o Império eram os grandes fazendeiros. A maior evidência foi o fato de durante todo o governo imperial até meados da República, as exportações de café do Brasil representarem 60% do consumo mundial (surgindo a expressão “barões do café”). Logo, qualquer tentativa do imperador no sentido de extinguir o sistema escravocrata, poderia ter dado fim ao Segundo Reinado bem antes do enigmático 15 de novembro de 1889.

Obviamente, uma coisa não justifica a outra. Pois o fato é que durante a Monarquia a escravidão persistiu, e seu fim se deu tardiamente, beirando o início do século XX. Mas é importante salientar que esse não era o desejo verdadeiro da Família Imperial, como veremos.

O Segundo Reinado foi marcado por dois grandes acontecimentos: A Guerra do Paraguai e o fim da Monarquia, com a proclamação da República pelo Marechal Deodoro da Fonseca. No primeiro caso, após o fim do combate, o país vivia uma crise econômica por causa do desgaste sofrido na guerra. Era um motivo que deixava boa parte da população descontente com o imperador Dom Pedro II, em especial o Exército. Entretanto, durante a guerra, observou-se um fenômeno: pela primeira vez na história, brasileiros de todas as regiões pegaram em armas espontaneamente para defender a nação, os chamados Voluntários da Pátria. Estes eram formados por pessoas livres e escravos. Muitos escravos foram para os campos do Paraguai já na condição de libertos pelos seus senhores, que em troca recebiam títulos de nobreza da Coroa. Tal fato evidenciara o sentimento de unidade nacional que pairava entre os brasileiros, mesmo entre aqueles de diferentes regiões do país e os escravos, que naquele momento passaram a ser vistos como integrantes da população e não como mera propriedade.

Além do evento descrito, onde escravos ganhavam sua liberdade(alforria) por atuarem na guerra, diversos dispositivos foram criados a fim de eliminar a escravidão no país. Todavia, tal conquista se deu de modo lento e gradual, como veremos.

Dentre as leis que tiveram por objetivo acabar com o sistema escravocrata tivemos: Lei Eusébio de Queirós; Lei do Ventre Livre; Lei do Sexagenário; e a gloriosa Lei Áurea. Todas estas leis, em maior ou menor alcance, representaram avanços no sentido de extirpar uma prática que, além de obsoleta no contexto do século XIX, era imoral.

A Lei Eusébio de Queirós, aprovada em 4 de setembro de 1850, proibia o tráfico de escravos do continente africano que ocorria através do oceano Atlântico. Na ocasião, houve pressão inglesa na tentativa de viabilizar tal lei por meio do chamado “Bill Aberdeen”, um instrumento que permitiu à marinha inglesa aprisionar navios suspeitos de transportar escravos no oceano Atlântico. Na época, a Inglaterra (diferentemente do Brasil) vivia o contexto pós Revolução Industrial, com um movimento abolicionista organizado e orientado com base em valores religiosos.

Aprovada em 28 de setembro de 1871, a Lei do Ventre Livre determinava a libertação dos filhos de escravas. Sua promulgação ocorreu na ausência do imperador, ficando sua filha, D. Isabel, na regência. A princesa assinou, sem hesitar, a referida lei de autoria do então presidente do Conselho de Ministros o Visconde do Rio Branco (José Maria da Silva Paranhos), do partido conservador. Tal lei significou um grande passo em direção à abolição.

Ainda na regência da princesa Isabel, a Lei do Sexagenário, promulgada em 28 de setembro 1885, autorizava a emancipação apenas dos escravos maiores de sessenta anos, os quais não representavam praticamente nenhuma força de trabalho para seus senhores. De fato, tal lei revelou pouquíssimo efeito prático, sem qualquer pragmatismo. Uma vez que desobrigava os fazendeiros de sustentar os negros idosos, enquanto que estes já não possuíam mais condições de arcarem com o próprio sustento. Tal lei só beneficiava os chamados “ladinos”, escravos que trabalhavam na Casa Grande e eram tratados quase como membros da família (exemplo, Tia Nastácia).

E finalmente, no glorioso dia 13 de maio de 1888, na terceira (e última) regência da princesa Isabel, em virtude do estado de saúde do Imperador, foi assinada a Lei Áurea, tornando os brasileiros iguais perante a lei, sem a distinção entre escravos e livres! Naquele momento, D. Isabel carregava o fardo de saber que sua Pátria era estigmatizada, na esfera internacional, como o único Estado escravocrata do mundo ocidental. Vale lembrar, que a Constituição Imperial, de 1824, não previa a escravidão em seu texto.

Pela terceira vez na regência, a princesa Isabel já era madura politicamente para impor suas vontades aos ministros. Foi o que ocorreu materializado na Lei Áurea. Isso lhe rendeu o apelido pelo qual veio a ser conhecida pelas gerações futuras – a Redentora. Todavia, se antes da promulgação da Lei Áurea, alguns setores, dentre eles o Exército, estava descontente com o governo imperial, e após a sua vigência foi a aristocracia rural que passou a exalar seu descontentamento.

Diante desse panorama o Império já se achava desgastado e vítima de conspirações republicanas que visavam sua queda. Foi o que ocorreu. No dia 15 de novembro de 1889 a República foi proclamada (senão um golpe), e a Família Imperial obrigada a deixar o Brasil. Mesmo sabendo que sua decisão colocaria em risco a manutenção do sistema, a Princesa Isabel não se arrependeu de ter dado sua contribuição para a história da nação Brasileira, engajando – se com a causa abolicionista. Seu falecimento ocorreu na França, em 14 de novembro de 1921 eu seu nome ficou ligado ao 13 de maio de 1888.

Deus salve a Princesa e o Imperador Pedro II! Abolicionistas, assim como tantos outros do período.

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